Você está ciente de sua responsabilidade?
Os tradutores devem sempre estar cientes do quanto a escolha lexical é importante ao traduzir um texto. São as palavras que escolhemos que definirão o tom da obra e que veicularão o pensamento original do autor. Esse mês pude presenciar uma situação em que essa responsabilidade do tradutor ficou (ainda mais) evidente. Todos nós, como tradutores, precisamos ter em mente o quanto somos responsáveis por nossa tradução e o quanto podemos comprometer o trabalho de um autor ao fazer escolhas infelizes.
Há algumas semanas fui assistir a uma aula com meu marido, no curso que ele faz do professor Luiz Gonzaga de Carvalho, sobre um livro de Aristóteles. A certa altura, um aluno pegou o livro-base do curso e fez uma pergunta ao professor. A dúvida não era sobre, mas envolvia um termo grego cujo significado na filosofia, ao que foi explicado, é bem específico, mas que facilmente induz a uma tradução errada se o tradutor não estiver bem atento ou não dominar realmente o assunto.
Aconteceu exatamente isso. A tradução do termo não estava correta e quem foi induzido ao erro, no fim das contas, foi o aluno/leitor, pois confundiu os conceitos determinados por Aristóteles. O professor, felizmente, já estava ciente sobre a confusão dos termos e conseguiu esclarecer a dúvida do aluno, pedindo que cada vez que a palavra X aparecesse no texto, ele pensasse na palavra Y, que seria a tradução correta. Desculpem, eu realmente não lembro qual palavra é, mas pelo que entendi da explicação do professor, o tradutor usou a mesma palavra X para traduzir dois conceitos diferentes da língua grega, sendo que a tradução de um deles deveria ser a palavra Y. Imagine a confusão que isso causa ao leitor!
Depois da aula, conversando com o professor Luiz Gonzaga, que também é tradutor e revisor há vinte anos, entramos na questão de como os iniciantes se colocam diante dos textos que traduzem. O quadro que ele me passou não foi animador. Ele contou que, quando ainda revisava traduções, ficava assustado com a falta de conhecimentos gerais e o pouco (ou quase nenhum) comprometimento com a pesquisa dos tradutores novatos, o que deixava os textos com erros básicos e absurdos. Dois exemplos clássicos que ele citou: a tradução de “The Holly Land” por “Terra Sagrada”, quando o certo é “Terra Santa”, e a tradução de “The Plague” por “A Praga”, quando o certo é “A Peste”.
O fato é que, se o tradutor não tem como saber sobre todos os assuntos, ele ao menos deve ter tino para a pesquisa. É um dos requisitos básicos e indispensáveis que se espera de um bom tradutor. Traduzir palavra por palavra qualquer um faz, mas traduzir conceitos e idéias com precisão é trabalho suado, exige pesquisa e aprofundamento por parte do tradutor. Há, ainda, certos assuntos que somente um tradutor especializado pode traduzir. Há de se ter humildade para recusar um trabalho para o qual não estamos preparados ou não temos aptidão. É uma escolha mais do que inteligente dizer não nessas horas. Porque, assim, o tradutor não queima seu filme no mercado e não compromete a obra do autor nem a compreensão do leitor.
Esses dias, li um texto muito interessante que convém indicar aqui, chamado “Tradução boa e tradução ruim”. Você pode (e deve!) ler aqui.
4 Respostas para “Você está ciente de sua responsabilidade?”
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- 08/11/2010 -
- 05/03/2013 -
Que coincidência, Lorena!
Ontem mesmo li esse texto que você indicou no final do post. Fui parar lá depois de ler o comentário de alguém da FASTRAD no blog Tradutor Profissional – nem recente era, foi fuçando que encontrei! Realmente os comentários ali são muito interessantes. Um outro post do mesmo blog também é uma uma boa indicação: http://www.fastrad.com.br/blog/index.php/2010/10/dicas-de-traducao/
abraço!
Nossa, Marie! Legal quando um texto serve a pessoas diferentes, com propósitos diferentes, mas no mesmo instante. Acho isso fascinante na internet! É verdade, esse outro post também está cheio de dicas legais, obrigada por ter colocado o link. Beijos!