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Por que ter um blog pode tornar você um tradutor melhor

Eu adoro escrever no Ao Principiante e me dedicar ao blog sempre que posso. Muitas pessoas me escrevem pedindo dicas e sugestões, querendo iniciar seus próprios blogs. Muitas delas, porém, ficam em dúvida sobre por que escrever e manter um blog. Para mim, há muitos motivos para se ter um e compartilho os que acho mais importantes abaixo.

  1. Escrever periodicamente em um blog melhora a escrita, o poder de concisão, a criatividade e a capacidade de revisar o próprio texto.
  2. Força a avaliar mais a fundo questões importantes sobre a profissão, a pesquisar mais sobre o mercado e as práticas do setor.
  3. Amplia a rede de contatos e traz oportunidades reais de trabalho e parcerias.
  4. Aumenta o conhecimento sobre ferramentas da web.
  5. É uma doação ao setor. É retribuir a ajuda que outros profissionais já nos ofereceram.
  6. É um canal de comunicação com os profissionais mais novos (de idade ou de profissão), o que ajuda a reciclar nossa visão da indústria e a conhecer novas práticas.
  7. Nos faz olhar nosso próprio caminho profissional e enxergar possíveis mudanças de percurso.
  8. Você sente que não está sozinho. Escrever sobre dificuldades, dúvidas ou simplesmente dar uma opinião gera comentários de pessoas que já passaram pelas mesmas situações.

A tradução e os novos formatos de educação

Tenho pensado bastante sobre como muitos formatos da educação hoje não se aplicam a novas profissões, ou a profissões que se desenvolveram de tal maneira que os formatos mais rígidos não conseguiram acompanhar. Acho que podemos relacionar a tradução a este último caso.

Até um tempo atrás, fazer quatro anos de faculdade, pegar o diploma e ir trabalhar numa empresa era ponto pacífico em quase qualquer profissão. Até que nos vimos envoltos em tantas tecnologias novas e maneiras diferentes de nos comunicarmos e fazermos nossos trabalhos, que o tradicional escritório  foi sendo cada vez mais repensado.

Exemplo melhor que a tradução não há. Desde a formação propriamente dita, até o modus operandi da profissão. É preciso diploma para ser bom tradutor? Não. É preciso, sim, estudar, mas esse ramo de atuação nos permite tantas formas diferentes de fazê-lo que a formação universitária a que estamos acostumados nem sempre está em primeiro plano.

Isso me lembra um artigo que li há um tempo, chamado The End of College?, que, acredito, se aplica perfeitamente à situação do tradutor de várias formas. Gostei muito dessa observação final da autora do artigo, fazendo uma separação entre o estudar para adquirir conhecimento e o fazer treinamento para obter qualificação:

New organizations will be created that offer workplace credentials, and traditional colleges will be free to research and teach without worrying about job training. And this will be a great thing. Our grandkids will be able to save time and money by getting badges targeted to the specific areas in which they work. And if they do go to college, they will be able to enjoy a wonderful concept that has been almost entirely lost by our modern education system: To learn simply for the sake of learning.

No fundo, não é este um problema de muitas universidades que oferecem cursos superiores para tradutores? Essa mescla entre o conceitual e a prática, que nem sempre dá liga? O aluno sai do curso tendo tido pinceladas de teoria e prática insuficiente, não se aprofundando nem em uma coisa, nem em outra. Chega no mercado e sente que não está preparado para ele.

Felizmente, existem muitas maneiras de compensar essas lacunas. Os programas de mentoria, por exemplo, sempre me chamaram a atenção. Gostaria que no Brasil eles fossem mais difundidos, mas tendo a acreditar que a coisa está caminhando para isso. Aliás, você sabia que o ProZ já tem um programa desses?

Outra coisa é que, hoje, a internet é a grande (se não a principal) aliada na formação do tradutor. A quantidade de treinamentos, cursos, seminários, artigos, vídeos oferecidos na web é incrível (ótimos exemplos são os sites Khan Academy, Coursera e o próprio ProZ). O tradutor que usa recursos online já pode ser considerado um profissional arrojado, por cuidar de sua formação/atualização de maneira independente e, por vezes, inovadora. É como diz este artigo aqui sobre formação superior online:

(…) another area of concern was the ability of recent graduates to use online technologies (such as email, calendars, etc.) for professional purposes. Brick-and-mortar schools typically provide at least some exposure to these tools, but the training students receive is often sporadic and sometimes outdated. Online schools not only help students develop digital skills, but allow students to use a variety of cutting-edge utilities while gaining experience in turning their computer into a productivity tool. Further, simply choosing to attend college online demonstrates that you’re a computer-savvy individual who stays at the vanguard of technology.

Se pararmos para pensar, as possibilidades de aprendizado para um tradutor são praticamente infinitas! Quem está procurando se especializar, por exemplo, pode participar de eventos ou fazer cursos específicos das áreas pelas quais se interessa. Não é preciso ficar restrito ao estudo da tradução em si. Pelo contrário, quanto mais formos além na busca do conhecimento, mais capacitados seremos.

Por fim, creio que podemos tirar grandes vantagens do caráter versátil da nossa profissão. Não reclamemos sobre acompanhar as novas tendências. O tradutor de hoje, ele mesmo, já é uma nova tendência do mercado. Com tantos recursos e facilidades, não será difícil mantermos esse status.

O primeiro trimestre da gestação

Primeiro trimestre de gravidez não é fácil, gente! Esses primeiros meses mudaram totalmente minha rotina, tanto pessoal, quanto de trabalho.

No primeiro mês não sabia da gravidez e, por conta de uma situação difícil pela qual passei, a alimentação e o sono ficaram muito prejudicados. Por isso, meu corpo entrou no segundo mês da gestação implorando por descanso e comida!

Apesar da fome imensa (= sensação de ter um Pacman no estômago), tive enjoos constantes, acompanhados de cansaço excessivo e quedas terríveis de pressão. Essa última acabou me deixando de cama várias vezes, às vezes quase o dia todo. Não conseguia sair de casa 5 minutos sem passar mal.

Nesse ritmo, comendo azeitonas como se não houvesse amanhã, chegou o terceiro mês. E aí não tive outra opção senão remanejar/renegociar prazos, recusar (bons) projetos e apertar o cinto para aguentar a diminuição da renda. A conversa franca com alguns clientes foi fundamental para não estremecer as relações.

Confesso: parecia que esses três meses iriam durar para sempre. Além de todo mal-estar e montanha-russa emocional, ficar preocupada com a pausa no trabalho não ajudou. Não é só uma questão financeira, mas também o receio de perder clientes ou demorar para conseguir retomar as coisas.

Agora, no quarto mês, as coisas estão infinitamente diferentes. Já voltei a uma rotina normal de trabalho (com mais pausas para comer ou tirar um cochilo, que o corpo pede e não dá para negar). Os clientes não fugiram, e logo deu para respirar e soltar o cinto pra barriga poder crescer. 😉

A lição aprendida: dar uma parada no trabalho, remanejar projetos ou recusar serviço não é tão dramático quanto parece. Nunca achei que começo de gravidez fosse tão difícil fisicamente, mas esse impedimento de trabalhar me fez aprender a ficar mais tranquila diante de situações que mudam repentinamente. E, sendo mãe, acho que vou precisar lidar muito com as mudanças de rotina, de qualquer forma. Quanto antes souber lidar com as adversidades, melhor!

O que vem por aí

A gente está sempre realizando coisas novas, e muitas delas exigem um longo aprendizado. Podemos ser veteranos em algumas áreas, mas “meros” principiantes em outras. Ganha-se experiência de um lado, corre-se atrás dela de outro.

Volto a ser iniciante, agora no que, para mim, será o aprendizado mais importante de todos: ser mãe. Não apenas porque serei mãe de primeira viagem, mas porque serei mãe freelancer de primeira viagem.

Como vai ser isso tudo? Como será conciliar os cuidados com o bebê e minhas obrigações profissionais? Do que precisarei abrir mão? O que pode permanecer como está?

Não são perguntas retóricas! Todas elas estão passando pela minha cabeça e precisam ser solucionadas, porque não dá para separar totalmente a mãe da tradutora. Por isso, nesse espaço, quero dividir com vocês as descobertas, as tentativas, os erros e os acertos que estão por vir. Espero que se juntem a mim nessa aventura!

Os manuais, a leitura e a escrita na tradução

Depois de ter escrito o artigo  Crie seu próprio guia de estilo, ocorreu-me que seria interessante falar também sobre a escrita na tradução de modo mais geral.

Todos sabemos que manter a padronização de termos numa tradução, principalmente na técnica, é essencial e confere qualidade superior ao texto. Mas a padronização em si é apenas uma pequena fatia do produto final, já que um texto não se limita apenas a convenções terminológicas ou ortográficas.

Para entender melhor, vou usar alguns textos do filósofo Olavo de Carvalho. Cito abaixo trecho de A arte de escrever, Lição 1: Esqueça o Manual de Redação. Lembrando, antes, que 1) o autor discorre sobre a produção de textos originais, e não de traduções; 2) o texto foi escrito tendo em mente o contexto jornalístico, portanto, guardemos as devidas proporções e ressalvas; e 3) ainda que não fale de tradução propriamente dita, o texto ajuda a entender a importância de saber escrever e de como escrever, e isso, claro, diz muitíssimo respeito à atividade tradutória.

Vamos ao trecho, então:

A padronização pode ser um mal inevitável. Mas para que exagerar, vendo nela um bem absoluto, o modelo mesmo de boa escrita? (…)
Normas de redação, se estatuídas, devem ser apresentadas, com toda a modéstia, como convenções práticas, neutras, nem melhores nem piores que quaisquer outras, e nunca como padrões de “bom gosto”, “elegância”, etc., que são valores de estética literária muito mais sutis do que aquilo que esse gênero de manuais está em condições de delimitar. Os manuais deveriam ater-se, o quanto possível, a aspectos exteriores e “materiais” da escrita, como ortografia, abreviaturas, padronização de nomes, evitando pontificar sobre estilo ou, pelo menos, opinando nisto com extremo cuidado e tão somente em nome da conveniência utilitária, não da estética.

A primeira questão é que, realmente, a forma (“ortografia, abreviaturas, padronização de nomes”) é diferente do estilo (“‘bom gosto’, ‘elegância’, etc., que são valores de estética literária”), então talvez seja um pouco equivocado se falar em “manual/guia de estilo”. Talvez o mais adequado fosse “manual/guia de padronização”, ou algo semelhante.

A segunda questão é muito importante para o tradutor. Quando o autor diz “Mas para que exagerar, vendo nela [na padronização] um bem absoluto, o modelo mesmo de boa escrita?”, resta claro que a padronização terminológica ou ortográfica de um texto não basta para que ele seja bom. Levando isso para a atividade tradutória: ainda que a terminologia e os aspectos formais da língua estejam uniformizados na tradução, há muito mais que devemos fazer para ser ela considerada uma tradução de qualidade. Trata-se da “estética literária”, das sutilezas da língua e do estilo.

É claro que a questão de estética terá níveis diferentes dependendo do que traduzimos. Traduções de textos técnicos exigem menos esforço literário, digamos assim, do que as de contos, crônicas ou poemas. Creio que vocês entendem a diferença.

Agora, para desenvolvermos um texto que não apenas gire em torno da uniformização terminológica, mas que tenha também riqueza de vocabulário, ausência de ambiguidades ou termos equivocados, ideias concatenadas (entre si, e entre a tradução e o original), adequação etc. é preciso saber escrever bem. E para escrever bem, voltemos à velha máxima: é preciso ler. O tradutor lê o tempo inteiro, mas é fato que, se ele ficar restrito às leituras de trabalho, será cada vez mais difícil enriquecer não só seu vocabulário, como também seu imaginário. Até porque, nem tudo que nos cai nas mãos para traduzir é bem escrito ou tem bom conteúdo.

Cito mais um trecho de A Arte de Escrever… (grifo meu):

A amoldagem da cabeça humana a um conjunto de normas práticas, não contrabalançada pela consciência do caráter meramente convencional dessas normas, pode produzir nela uma verdadeira mutilação intelectual, tornando-a, a longo prazo, incapaz de compreender e apreciar o que quer que esteja fora do padrão costumeiro. A quase absoluta incapacidade para a leitura de textos mais abstratos, de filosofia e ciência, por exemplo, que observo em tantos de meus colegas, não resulta de nenhuma deficiência congênita, mas do costume adquirido de lidar com uma só das dimensões da linguagem, deixando atrofiar a sensibilidade para todas as demais: o hábito da escrita plana e rasa produz a leitura plana e rasa.

Quando falamos de traduzir, não falamos somente da transposição de ideias de uma língua a outra, mas também de como essa transposição é feita, e seu meio é a escrita. Isso quer dizer que escrever não pode ser considerado um ofício menor do que o ato de traduzir em si. Ao contrário: escrever é o meio de que se vale para fazer tal transposição sendo, portanto, parte essencial e mais visível do trabalho do tradutor. Afinal, o leitor não terá acesso ao original e não fará uma análise de nossa transposição de ideias. O que ele tem em mãos é o produto final, um texto pronto, escrito em seu idioma materno.

Mas para que a escrita, de modo geral e na tradução, seja bem desenvolvida, não basta ler. É preciso saber ler. Em Aprendendo a escrever, Olavo de Carvalho adverte:

A seleção das leituras supõe muitas leituras, e não haveria saída deste círculo vicioso sem a distinção de dois tipos: as leituras de mera inspeção conduzem à escolha de um certo número de títulos para leitura atenta e aprofundada. É esta que ensina a escrever, mas não se chega a esta sem aquela. Aquela, por sua vez, supõe a busca e a consulta. Não há, pois, leitura séria sem o domínio das cronologias, bibliografias, enciclopédias, resenhas históricas gerais. O sujeito que nunca tenha lido um livro até o fim, mas que de tanto vasculhar índices e arquivos tenha adquirido uma visão sistêmica do que deve ler nos anos seguintes, já é um homem mais culto do que aquele que, de cara, tenha mergulhado na “Divina comédia” ou na “Crítica da razão pura” sem saber de onde saíram nem por que as está lendo.

Portanto, não é “ler de tudo” o que realmente nos faz aprender a escrever bem, mas sim a seleção que fazemos dentro desse “tudo”. É tarefa difícil, mas tendo consciência de que existem esses dois tipos de leitura, fica mais fácil nos atermos àquelas que nos serão mais úteis.

Para quem quer ser escritor, no mesmo texto o filósofo dá um conselho que nós, tradutores, podemos aproveitar, já que, em certa medida, somos também escritores:

Mas a aquisição do código supõe, além da leitura, a absorção ativa. É preciso que você, além de ouvir, pratique a língua do escritor que está lendo. Praticar, em português antigo, significa também conversar. (…)

Ou seja, para escrever bem, além de ler bem, é preciso praticar. Isso envolve, também, a tradução. Para se traduzir bem, só com a prática. E essa prática é algo contínuo, que não termina nunca. A vatangem da nossa profissão é que, quanto mais velhos e experientes ficamos, mais valor temos. Enquanto um atleta vê seu corpo e seu desempenho declinarem com o tempo, um tradutor vê sua mente cada vez mais em expansão. E, com as constantes leituras e exercícios de escrita e tradução, maior é sua capacidade de construir um texto rico, coeso e coerente, porque maiores são suas referências e experiência de mundo.

Isso pode se dar de muitas formas, desde traduzir textos de assuntos ou autores que nos interessam nas horas vagas, até arriscar a escrever textos literários em um blog. Há também um tipo de exercício que Olavo de Carvalho indica como método para aprimorar a escrita, que é o da imitação. Pegar um autor que gostemos (por exemplo Eça de Queiroz, Manuel Bandeira, Clarice Lispector etc.) e escrever imitando seu estilo. Segundo ele,

A imitação é a única maneira de assimilar profundamente. Se é impossível você aprender inglês ou espanhol só de ouvir, sem nunca tentar falar, por que seria diferente com o estilo dos escritores? (…) imitando um, depois outro e outro e outro mais, você não ficará parecido com nenhum deles, mas, compondo com o que aprendeu deles o seu arsenal pessoal de modos de dizer, acabará no fim das contas sendo você mesmo, apenas potencializado e enobrecido pelas armas que adquiriu.

Assim, não é difícil notar que fazer boas traduções pressupõe esforço contínuo: seja seguindo com cuidado as regras de padronização, seja desenvolvendo nossa capacidade cognitiva por meio de boas leituras ou aprimorando nossa escrita com exercícios práticos. O conjunto de todas essas coisas, aliado ao cuidado com o texto original e com a profissão em si, é o que faz um tradutor caminhar cada vez mais para a completude.

Mais um começo!

Olá, pessoal!

Outro dia ouvi de orelhada na rua alguém dizer que não gosta das comemorações de final de ano, porque tudo é sempre igual. Dia 31 de dezembro é um dia qualquer, assim como 1 de janeiro. Que diferença faz se estamos num ano ou em outro?

Penso diferente. Primeiro, porque os dias nunca são iguais. Nem as horas, nem os minutos. Segundo, porque acredito que o ser humano precisa de ciclos, de períodos que se fecham e outros que se abrem, a exemplo, inclusive, da própria natureza. Só assim para conseguirmos parar e olhar para nós mesmos, avaliarmos quem somos, o que nos tornamos e as mudanças que queremos fazer em nossas vidas.

Acho que isso fica mais fácil de notar no campo profissional. As mudanças, os aprendizados e as conquistas ficam mais evidentes. É um curso que se faz, um novo emprego que se consegue, uma oportunidade de ouro que aparece. A gente sente o crescimento de maneira quase palpável, e junto com ele, o amadurecimento.

Isso me lembra a palestra da querida tradutora e amiga Isabel Vidigal, na Conferência do ProZ. Ela disse que é preciso ter paciência e investir muito tempo da nossa vida para construir a carreira de tradutor. Eu gostaria de complementar: não só tempo, como energia. E energia é renovável, não é mesmo?

Por isso, feliz novo ciclo e feliz 2012!

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